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McDonald's, Bombs & Coke ou a Febre de Sexta-feira à Noite


Depois de sete dias em Goa rumámos a New Delhi e dali seguimos num boeing da China Airlines para Shanghai onde no Hilton Hotel os arquitectos da ponte entre o Ocidente e o Oriente abanam o capacete nas noites rociadas de amor e eis que dou por mim a observar contigo do último piso a enorme e fulgurante estrela vermelha do partido que governa o dragão encimada num edifício da marginal mas logo noto o teu olhar amargurado preso nas crianças e velhos que destilam miséria amarela lá em baixo nas barcaças oscilantes do rio e enxergo agora duas lágrimas silenciosas que te saltam dos olhos e se despenham em miríades frente aos quarenta pisos do hotel e o meu pensamento voa para um país remoto e manso lá para as bandas do poente onde clamam pela tua presença num estranho blog mas tu não acorres ao chamamento E assim resolvemos deixar Shanghai e passar à sifilítica Saigão último reduto do Tio Sam em terras do Vietname que daqui deu às de vila diogo rebaptizada agora de Ho Chi Min onde o teimoso Uncle regressou desta feita com outras bombas e bandeiras que são as da adocicada e pegajosa Coca-Cola e as do viscoso e gordurento McDonald's Aqui nos chegam mais uma vez pelo telemóvel notícias do povo que do sol-posto exige a tua comparência e procuras um cyber tea para lhes dares notícias tuas e interpelas em inglês uma jovem vietnamita mas como ela não te entende fazes o gesto de levar uma chávena aos lábios e escreves num teclado imaginário ao mesmo tempo que desenhas no maço de Marlboro os traços invisíveis dum monitor de computador e ela faz-te um breve sinal de entendimento e leva-nos a um bar do outro lado da rua onde vários viets que sobreviveram ao napalm do Uncle Sam bebem chá e pigarreiam enquanto vêem na TV colocada sobre um velho piano um wild west cowboys spaghetti Aí tens cara amiga o que pediste uma chávena de chá um teclado – oh o teclado duma pianola - e um monitor de vídeo e achas sintomático o nome do bar “Apocalypse Now” e não havendo nada a fazer desistes da Net mas agora ao fim de sete dias já não podemos com o cheiro das cobras fritas nas ruas da ex-Saigão nem com a insistência das prostitutas que me abordam aos magotes a pé ou de riquexó não se importando minimamente com a tua presença e deixamos esta Ho Chi Min da miséria e do pecado e metemo-nos num avião da Singapore Airlines com destino ao paupérrimo e desventurado Tibete não para passarmos nele sete anos como o outro mas sim sete dias Estamos na cidade de Lhassa em terras roubadas aos lamas pelo imperialismo chinês que cospe aqui as suas leis - o Tio Sam aqui já não se mete - e o teu olhar silente observa no palácio-mosteiro de Potala os calmos monges de Buda de opas laranja como se pertencessem ao partido dum pequeno país do sol-posto em cânticos monocórdicos com horas de sepulcral silêncio e tu sorris pois a tua música também é feita de silêncios o teu destino tal como o meu é Katmandu mas como decidi aceitar o convite que Sua Santidade o Dalai Lama me fez em Lisboa por achar que a minha meditação e o meu silêncio eram merecedores dum prémio para permanecer sete dias no Tibete resolveste acompanhar-me e daqui seguirás para o hotel enquanto permaneço à chuva em frente do Potala e depois numa cerimónia monástica curvado ao toque do gongo olho de soslaio para a rua e verifico que desceste do riquexó que te levaria ao hotel e que te encontras agora no meio dos militares chineses os mesmos que me fulminaram com os olhos quando na véspera pronunciei a palavra TIBETE e os chinos berraram que essa palavra é maldita pelo que já não existe e que agora se deve dizer XIZANG ao que tu na altura soltaste uma estentórica gargalhada como é costume em situações burlescas e eles ainda mais se agravaram connosco mas lá nos deixaram permanecer na cidade mítica dos Lamas onde os ascéticos monges riram em silêncio quando repararam que eu tinha a cabeça rapada como eles e deram-me então uma túnica que coloquei sobre as jeans e t-shirt e logo ali fiquei monge enquanto tu rias a bandeiras despregadas sob o olhar grave dos bonzos quando me ofereceram uma malga dizendo que estaria quase sempre vazia Soltaste de novo uma sonora e cristalina gargalhada tendo os sacerdotes budistas fixado em ti os seus olhares circunspectos estranhando o teu salutar sentido de humor e depois de sete dias para mim bem dormidos e mal comidos amanheceste no hotel com a alvorada das estrelas e surgiste no Potala de onde saímos na companhia de três bonzos calmos e silenciosos como nós e montados em muares nos dirigimos para os gélidos Himalaias a caminho da alvacenta Katmandu carregada de neve onde recentemente o príncipe herdeiro matou toda a família e se suicidou em seguida no palácio dos mil e setecentos aposentos Deveríamos partir daqui para Bagdad mas não conseguimos os vistos dado que neste momento o Uncle Sam toma conta daquela cidade mártir e de todo o país de que é capital os quais destruiu durante três semanas a fio na mira do sangue negro que corre pelas suas entranhas e ainda com o fito de atulhar aquela pobre gente com o colesterol dos viscosos hambúrgueres e a cocaína da pegajosa bebida Assim muito em breve chegaremos a Olisippo a bela capital a que uma amiga chama Lisoptima na qual reina a paz e a concórdia o que sem dúvida se deve à sorte de ser capital de um país de brandos costumes que não tem no subsolo uma única gota do viscoso ouro negro que se dá pelo nome de crude mas agora é de novo noite na cidade das sete colinas onde os astros nus beijam as casas e as árvores e vagueio em sonho por entre estas e as vagas de vento frio e húmido que ameaça chuva e procuro o teu rosto os teus olhos os teus lábios e a textura veludínea e quente da tua pele mas não os encontro pois que estão na margem do silêncio profundo para além de todos os rios e dos sete abismos que marginam as montanhas da distância perene...

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