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Distanciando-se das obtusas complicações do presente, trazia saudosamente à memória o tempo primordial e simples, um nostálgico caleidoscópio de cores e brilhos irradiados pelos espelhos de luz das ribeiras da sua infância, repletas de juncos, libelinhas, nenúfares e risos de crianças.

A minha praia



A "minha" praia fica não muito longe da Praia de Ingrina (Igrina na "Obra Poética" III, 4ª Edição), da nossa saudosa e amada Sophia de Mello Breyner Andresen, onde "o grito da cigarra ergue a tarde a seu cimo e o perfume do orégão invade a felicidade» e onde se vê «o mar reflectido no seu primeiro espelho."


A minha praia


A minha praia é como uma sala de cinema.
Depois de um filme outro filme vem,
com novos actores e novo tema.

Pelo ângulo raso das horas
chegam à praia as barcas d’ alva.
Têm por âncora os músculos
bronze dos pescadores
e por alavanca os tractores
que sulcam a areia molhada.

Evanescentes torvelinhos de escamas e espuma
reflectem, bordados a oiro e púrpura,
os arrebóis da aurora.
É perpétua a sede da areia,
em cada fluxo mais sequiosa.

Estamos agora
no ângulo recto das horas.

No sol radiante da manhã clara
sobriamente gaiata
mudam-se os actores e as coisas.
É a vez dos nadadores-salvadores,
das bandeiras verdes
e dos primeiros veraneantes.
É tempo de bolas e de baldes de plástico,
de cadeiras de praia, toalhas, pára-ventos
e guarda-sóis de cores berrantes.

No rastilho luminoso de mar e sol
que penetra o azul eterno
vogam gaivotas de dorso cinzento
e peito de alabastro
trazidas pela viração aromada do galerno
que sereno sopra do largo
em perfeito contraste
com os escusados guarda-ventos.

Chegámos à prata do meio-dia.
Há legiões de corpos,
uns bronzeados, outros lácteos,
em descontrolada disputa
por cada palmo do areal.
E há gritos e risos de crianças,
brados de adultos
e pregões de vendedores de gelados.
E há corridas e passeios a pé
e desafinados mergulhos,
e repouso absoluto sobre a areia,
e até se ouve o roncar duma avioneta
sob os céus de Julho.

Diante do olhar tranquilo da cidade
tudo de novo se caldeia
em eternos fluxos e refluxos
que alternam a vazante com a maré cheia.

O bronze, ainda moço, desce do Sol
e em doces afagos amorena os corpos.
Aqui perto, munida de dois baldes de plástico,
uma criança tenta verter todo o mar
para um poço de areia e de cascalho,
diligenciando desvendar um mistério
que ouvira na catequese.
A seu lado, ofegantes,
dois jovens em piruetas de reviralho.
Mais à frente, joga-se volley de praia
e futebol de areia,
que irritam os que descansam
mas enrijecem e bronzeiam os que não se cansam.

Vai alto o Sol resplandecente
na tarde que aquece, imóvel,
sobre o longo declive
que baixa do zénite ao poente.

Numa ignescência
de sol e de sal,
êxtase são os risos e as algas,
enquanto alva a espuma continua
a sua dança de ventre com a areia.
No fresco remanso da brisa,
milhões de estilhas de luz beijam os ares
em eterno jogo de escondidas com o astro-rei.

É esta a praia onde te procuro,
na ausência da babilónia de vozes e de corpos.
É aqui que no breve sussurro do entardecer
um búzio me segredou, na maré nua,
que tu virás um dia pela noitinha,
ao nascer da Lua, pra eu te ver.







para ouvir a música - não visível-


“Jupiter and Juno”, from “The Loves of the Gods”,
by Annibale Carracci (1560-1609)

à deusa juno

em ti, bendita juno,
a consagração do mês das regas e das colheitas,
a que concedeste a nobreza do teu sacro nome.
um mês de solstício, de casamentos e namorados,
de suculentos frutos e legumes,
de santos populares e fogueiras,
mês da foice em punho
e do flavo trigo nas eiras.

é este o teu mês,
divina juno,
e nele quero relembrar
e honrar o teu bom-nome
e deixar o meu testemunho.

belas e rociadas de plenitude
as noites e as antemanhãs
que nos concedes na quietude dos dias.

na beleza dos teus olhos,
a embriaguez azul
da infinitude dos céus,
a mesma luz que ofusca e inebria
os humanos e os deuses.

em teus purpurinos lábios
o incitamento ao beijo.
no teu corpo divino
o amor, o desejo, a beleza,
a força feminina
que gera a vida
e canta a natureza.

zelosa em teu himeneu com júpiter,
único no olimpo,
proteges, na tua graça,
como se fora teu,
o casamento de todas as mulheres,
que acolhes e amparas no teu coração.

a ti, deusa da maternidade,
elevo a minha voz e o meu olhar
e ofereço,
na modéstia dos simples,
o meu humilde verbo.

a ti, juno - ou hera -
rainha dos deuses
que cintilante nos surges
na tua clâmide de oiro e estrelas,
ergo a minha taça de vinho romano
- ou grego, tanto faz!–
e brindo à tua pureza,
à tua sensualidade,
à tua excelsa beleza,
na infinidade do olimpo arcano
de onde sopram os ventos da paz
e onde tudo é claro e exacto
e imponente e não efémero,
porque divino, e não humano.

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades



José Mário Branco (adaptação - refrão a vermelho), instrumentação e interpretação do soneto “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”,de Luís de Camões


10 de Junho de 2008


Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre, tomando sempre novas qualidades.

E se todo o mundo é composto de mudança
Troquemos-lhe as voltas qu’ inda o dia é uma criança.

Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, e do bem, (se algum houve...) as saudades.


Mas se todo o mundo é composto de mudança,
Troquemos-lhe as voltas, qu’ inda o dia é uma criança.

O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.
E em mim converte, e em mim converte em choro o doce canto.


Mas se todo o mundo é composto de mudança,
Troquemos-lhe as voltas, qu’ inda o dia é uma criança.


E afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soía
Que não se muda, que não se muda já como soía.


Mas se todo o mundo é composto de mudança,
Troquemos-lhe as voltas, qu’ inda o dia é uma criança.

______________


“Dia da raça”, diz descabidamente o PR.

E eu digo: "dia inscrito em tempos de servidão e de desgraça, em que já se morre numa greve". (1)


(1) “Um elemento do piquete de motoristas em Zibreira, Alcanena (distrito de Santarém), foi atropelado mortalmente ao início da tarde (de hoje, 10 de Junho), por um camião que tentava furar o bloqueio (…)” (Agência Lusa, 10 de Junho de 2008)





Nada perdi de que fosse dono.
Nada ganhei do que não fora meu.
O que perdi? Tudo do nada que tenha tido.
O que ganhei? Nada do tudo que não tenha sido.
O que me resta? Nada do nada que não se tenha ido.


(imagem da autoria de Edna Feitosa)


uma intensa e profunda mágoa escapava-se-lhe dos olhos
como se todo o horizonte de água à sua volta se ensombrasse
e a natureza inteira se tivesse bruscamente desagregado
das estações de vivaldi para se unir à lacrimosa de mozart.









liberdade,
dignidade, justiça!









nascer.
renascer.


numa florescência de luz
suavemente nascer
e criar raízes.


serenamente renascer
por entre os lençóis de abril
sob a fragrância fresca
e impoluta dos cravos vermelhos.


tranquilamente nascer
- ou renascer -
sob o azul ameno
dos espelhos da esperança
que respira
e embala
e encanta
a primavera dos cravos
e da liberdade.




Onde param os espelhos da esperança?
Quem neles se vê ou revê?
Eu, não.

que as rosas - todas as rosas! - jamais espinhem o amantíssimo cravo.


25ABRIL2008



Pássaros cruéis


Green Day – “Wake Me Up When September Ends”







Pássaros cruéis


Um fluxo de dólares e de sangue
jorrando sobre a Mesopotâmia.
Um sino de fogo embutido nos umbrais do deserto.
E a fúria insana.
O crude golfando sobre o equinócio
num concerto de cinzas e de morte.

E há falcões.
Falcões que dançam e pairam sobre os soluços
do amanhecer sangrento.
Talvez abutres.

Cascatas de fogo, favilas calcinadas,
estilhaços, gritos, pedaços de argila.
Não há palavras. Apenas bombas e armas
e a morte galopando sobre as cidades.

Breve, um talismã tomba sobre o asfalto.
Um turbante esvoaça, branco,
sob o luar negro de fumo.
Calou-se a flauta de vento
que flébil gemia sob a tamareira.
Eternos e piedosos, a Lua e Vénus
velando a morte.

Cessaram os sorrisos no país de Aladino.
Sangue e lágrimas, apenas.
Um sem-fim de covas e cemitérios e morte.
A face lúgubre e sombria do fim.

Onde as crianças acordadas
no seu sonho peregrino?
Onde o berço da civilização? Onde a justiça?
Onde Babilónia, a dos Jardins Suspensos?
Onde as palavras que brotaram da argila?
Onde a água de sonho do Tigre?
Onde os pássaros voando na brisa levantina?
Onde as chispas de oiro e prata
das águas de espelhos do Eufrates
ora tintas de sangue?
Onde a mulher que embalava no berço
o seu menino de olhos de mel?
Onde o menino?
Onde a Babel?

A coberto dos ventos de opróbrio e azeviche,
nabucodonosores de barro tombam
-outros elevam-se! -
no resvalo da pedra de Sísifo.
Será tarde, muito tarde,
quando trepidantes de náusea
os corcéis de fogo do Apocalipse
migrarem para o frio
na companhia dos pássaros cruéis.

O verbo distorcido aguarda, receoso,
a frieza invencível da razão clara.
Viscoso e mole o mutismo dos homens
flanqueia a gelatina estática do caos.
Fenece, a pouco e pouco, o país de Gilgamesh.

____________________________________________

(Contador de actualização automática)


Após 5 anos de guerra:


Civis iraquianos mortos, em consequência da guerra:

desde 19MAR2003 até 25MAI2008, entre 84.050 e 91.713, segundo o Iraq Body Count;

654.965, segundo a prestigiada revista médico-científica britânica The Lancet, de 21OUT2006 (número de mortos calculado até 30SET2006)

Entretanto, segundo a CNN, as baixas das forças invasoras elevavam-se, em 23MAI2008, a 4.391 mortos (4.079 militares norte-americanos e 312 militares das restantes forças da coligação).

Militares norte-americanos feridos (até 23MAI08): 30.112 (fonte do Pentágono, segundo a CNN)


Morreram no Iraque 123 jornalistas, desde o início da guerra até 19MAR2008.,

Não são conhecidas as baixas das forças de segurança do Iraque bem como as dos chamados “rebeldes”.


"O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons."
Martin Luther King


Fontes:
http://www.iraqbodycount.org/
http://edition.cnn.com/SPECIALS/2003/iraq/forces/casualties/
http://www.thelancet.com/
http://icasualties.org/oif/

'erro bush' o mesmo que "erro crasso"








Os idos de Março sempre foram aziagos para os senhores da guerra.

Gaius Julius Caesar fora avisado por um áugure, quando a 15 de Março do ano 44 a.C. regressava da campanha da Gália, de que, como os idos de Março são fatídicos, não deveria entrar em Roma naquele dia. Insistiu, e entrou. O que aconteceu, já todos sabem. Foi apunhalado à entrada do Senado.


Mais de 2 milénios depois, nos idos de Março de 2003, “Georgius Bushus II”, “imperador da nova Roma”, decidiu invadir o Iraque, apesar da opinião contrária da maioria dos governos do Planeta, dado que as razões por ele aduzidas enfermavam de vários vícios. Ao arrepio das determinações da ONU e do bom senso, a guerra foi levada a efeito.


Talvez G. Bushus II não saiba desta coisa maléfica que são os idos de Março…


Embora os dicionários o não refiram - mencionam apenas que “crasso” deriva do latim “crassus” e significa “grosseiro” e “ignorante” - tenho para mim que o vocábulo deriva do nome de Marcus Licinius Crassus, homem grosseiro, teimoso e de medíocre talento, que foi cônsul e triúnviro da Roma Antiga, mercê da sua enorme fortuna e de fortes influências políticas.


Um dos muitos erros “crassos” daquele político romano foi não ter acatado os conselhos dos seus generais, ao pretender fazer guerra aos belicosos Partos, que apelidava de bárbaros imundos.


A Pártia englobava os territórios que vão da parte leste da Síria actual ao Afeganistão e Paquistão, e incluía todo o Irão e Iraque actuais, além de outras regiões vizinhas.


Crasso, devido à sua teimosia, viria a morrer às mãos dos Partos que tanto desprezava.


Talvez G. Bushus II também não saiba deste funesto acontecimento…


Acontecimento, aliás, já pressagiado (leia-se filmado) pelos 'áugures' do britânico "Channel 4", como se pode constatar no endereço seguinte (não é permitida a incorporação do clip no blog, pelo que trago, somente, a respectiva url):

http://www.youtube.com/watch?v=Wvwyx8Ai14U



Em comum com Marcus L. Crassus, temos que G. Bushus II ascendeu rapidamente na política auxiliado pela influência de instâncias poderosas e pela imensa fortuna familiar. Em comum, ainda, a invasão do Iraque e a tentativa de submissão da Síria e do Irão, para já não referir o Afeganistão (o outro tentou, mas morreu).


Creio que a “ nova Roma” tem dentro de si a figura temerária de um novo Marcos Licinius Crassus.


Quem diz que a História não se repete?


Entretanto, sugiro humildemente aos dicionaristas que passem a incluir nos dicionários um novo vocábulo: “bush”- adj., crasso, grosseiro, ignorante.


Nota: G. Bushus II declarou o término oficial da sua guerra de Pirro no dia 1 de Maio de 2003, altura em que o nº de mortos entre os seus soldados ascendia a 140 . A partir dessa data já morreram mais 3 715 militares, ou seja, 26,5 vezes aquele número (3 855 soldados norte-americanos mortos até 05NOV2007).


Que grande estratega, este Crassus moderno!!!


"Pilgrim" by Enya & The Hubble Deep Field by Tony Darnell

“(…)


Each heart is a pilgrim,
each one wants to know
the reason why the winds die
and where the stories go.
Pilgrim, in your jouney
you may travel far,
for pilgrim it's a long way
to find out who you are...


Pilgrim it's a long way
to find out who you are...


Pilgrim it's a long way
to find out who you are...”




Esta é, para mim, a mais bela homenagem prestada a Carl Sagan (1934-1996), porventura o maior astrónomo, astrofísico e astroquímico de sempre.


peregrino


Mikhail Ivanovitch Glinka, "Nocturno para harpa" (1839).





Quase nocturno



Engastado de mil cristais
é azul e fresco o céu nocturno.
Alta vai a Lua de Março,
círculo branco de prata
constelado pelo Serpentário.
Lua lânguida e trémula
que beija as ondas luminosas
do teu cabelo solto
e o carmim cintilante dos teus lábios.


Flava e imóvel
a seara de estrelas
paira sob a abóbada
zelosa do lume vivo dos teus olhos
e da doçura da tua boca fresca.


No veludo dos teus lábios
acesos na cor dos cravos
flutua um sorriso de fada.
Navego nesse sorriso
e naufrago na superfície dos teus olhos.
Trago nos meus abrigadas as mil distâncias,
essas linhas imensuráveis e exactas
que se fundem no sal mítico das lágrimas.


Trago nos pulsos o sangue roxo
das amoras bravas
e nos lábios o mel do verbo
que colhi contigo no verão passado.


E trago comigo o grito da águia solitária,
esse brado selvagem que ecoa no deserto
em cujas areias se fundem os meus sonhos
e onde as pérolas que brotam dos teus olhos
se desfazem em miríades de cristais
que sorvo silente a longos haustos.


Navego assim sem regresso
na curva ardente dos teus lábios
no rio fluente e sem margens
do teu sorriso ático.




Salvador Bacarisse - Concertino guitarra y orquesta, op. 72 - Romanza

___________________________________________________


Aceita com estoicismo a rejeição. Darás, assim, prova de elevação e de carácter, ao respeitar a liberdade de escolha dos outros.
Peregrino

__________________________________________________

Richard Strauss, “Assim falou Zaratustra, opus 30”, fragm. “Amanhecer” (1896).





Madrugada




se escutares
a voz de silêncio das estrelas,
ouvirás dizer que tu chegaste.
que chegaste nas asas do galerno,
essa corrente eterna
de ar oloroso e fresco
que sopra do mar.
e se olhares para trás,
para o rasto perfumado dos teus passos,
verás nos rostos dos que te seguem
o espelho cristalino do teu sorriso
solto no céu anil da madrugada.


[se te disser que chove na noite dos meus olhos
e que neva na madrugada do meu coração, não te minto.
são frases tão correctas como correcto é dizer-te que o quarto de lua
cavaqueia neste momento com a bela sadalmelik na constelação do aquário
e que o sol cintila, na sua luz branca, constelado pelo carneiro,
enquanto júpiter adormece, lânguido, no asterismo do sagitário.]




(29ABR2008, 22:00 horas)





Joaquín Rodrigo – “Concierto de Aranjuez” 2º Mov.
Interpret. à guitarra, Paco de Lucía (epdlp)




e todavia...



tudo volta ao princípio:
as flores, as pedras, a bruma, a tempestade...
e cada grão de tristeza
de que é feito o meu corpo
é levado pelo vento
e é-me devolvido pelo mar.
assim hoje,
tal como ontem e amanhã,
em ciclo,
incessantemente.


morrer leva tempo.
o tempo exacto de morrer devagar.
morri ontem, morrerei amanhã,
e no dia seguinte serei pedra, gelo, cinza, lava...
não sei onde mora o regresso.
só sei das folhas de outono e
das flores de inverno.
não das da primavera.


ainda que não chova,
outono-me na noite fria,
sem bússola nem polar,
por entre a neblina e as árvores.
divago assim dentro do inverno adiado
e adagio-me em arco sobre as cordas
tensas de um violino amargurado,
como se uma lia de veludo a partir-se.


[entanto, há tanto frio e tanta chuva morta,
e tantas folhas molhadas, perdidas de inverno,
penetrando oblíquas pelos umbrais da minha porta!...]





Gabriel Fauré (1845-1924), Pavana, opus 50.
.

Pavana triste pela mocinha
vitimada pelo coronel (in)sensível


Sim, quinze anos tinha
no seu corpo em brasa
a infeliz mocinha
que não tinha casa.
Tinha tranças d’oiro
e a pele alvacenta,
tu foste o primeiro
a arrastar-lhe a asa
naquele Janeiro
dos anos setenta.

Ela pai não teve
sequer tinha mãe
não tinha sapatos
não tinha vestidos
não tinha ninguém,
só dias sofridos.

Não havia lua
não havia estrelas
nem sequer abrigo,
a casa era a rua
da pobre donzela
que não tinha amigos.

O seu corpo grácil
de pele de alabastro
jamais resvalado
em sua puridade
não tinha cadastro
mas foi presa fácil
dum lobo esfaimado.

Se um dia voltares
à estrada velha
no negrume agreste,
detém-te e descobre-te,
acende uma vela.

Verás numa faia
- ou “feral cipreste”? -
a seta-coração
bem como a mensagem
que a bela catraia
em aflito pranto
no tronco entalhou
nessa noite túmulo
do seu corpo espanto.
Verás, para cúmulo,
que foste o primeiro
e também o último
a dar-lhe dinheiro.

(Peregrino)

NOTA:
a expressão “feral cipreste” foi retirada de "O Noivado do Sepulcro", de Soares de Passos.

já a seguir, o bolero do dito coronel:


Bolero do coronel sensível
que fez amor em Monsanto


Eu que me comovo
Por tudo e por nada
Deixei-te parada
Na berma da estrada
Usei o teu corpo
Paguei o teu preço
Esqueci o teu nome
Limpei-me com o lenço
Olhei-te a cintura
De pé no alcatrão
Levantei-te as saias
Deitei-te no banco
Num bosque de faias
De mala na mão
Nem sequer falaste
Nem sequer beijaste
Nem sequer gemeste,
Mordeste, abraçaste
Quinhentos escudos
Foi o que disseste
Tinhas quinze anos
Dezasseis, dezassete
Cheiravas a mato
À sopa dos pobres
A infância sem quarto
A suor, a chiclete
Saíste do carro
Alisando a blusa
Espiei da janela
Rosto de aguarela
Coxa em semifusa
Soltei o travão
Voltei para casa
De chaves na mão
Sobrancelha em asa
Disse: fiz serão
Ao filho e à mulher
Repeti a fruta
Acabei a ceia
Larguei o talher
Estendi-me na cama
De ouvido à escuta
E perna cruzada
Que de olhos em chama
Só tinha na ideia
Teu corpo parado
Na berma da estrada
Eu que me comovo
Por tudo e por nada

(António Lobo Antunes)




vazio



pois que frágil é o corpo
e efémero é o sonho,
talvez tenha sido
um incêndio de olhos,
quiçá de relâmpagos,
ou um reflexo de sol
sobre espelhos de água
de brilho intenso.


acaso um vento
magnético e solar
terá soprado naquele verão
numa estranha fluorescência de oiro e fogo
e iluminado, em intermitência,
qual boreal aurora,
os misteriosos altares do nada.



Johann Pachelbel, Cânone em ré maior (1680)






nas longas noites
que do céu caem
frias de inverno
no mês de jano
que imperturbável cresce
enquanto o glacial bóreas
talha sob o alvor do luar
os harmoniosos sincelos
quero incendiar-me
no fogo dos teus lábios
no fulgor dos teus olhos
no verão dos teus braços
no veludo quente da tua pele
e adormecer sob os altares de vento
da primavera dos teus cabelos.



Shambala



Passei a tarde toda à tua espera, à beira do lago do Jardim dos Poetas, na Cidade-Luz, esse flamejante paraíso da nossa Galáxia, onde rumorejam as fontes, os poetas e os deuses e vicejam o jasmim e o nardo, por entre palácios de zimbórios ogivados circundados por verdejantes e espaçosas alamedas.

O Sol flutuava sobre o Poente, quando observei a tua silhueta fascinante e sedutora no cimo da escadaria de mármore do Palácio do Caminho do Meio que margina o lago juncado de nenúfares multicores, à hora a que os céus se preparavam para entardecer sobre as dunas douradas do imenso e desmedido Gobi.

É esse, como sabes, o momento exacto e sublime em que a fulguração dos raios de luz do astro-rei produz um efeito alucinante de brilhos e refulgências sobre os rubis e safiras incrustados nas torres e cúpulas levantinas dos pujantes templos e palácios da Cidade-Cintilante.

Vi-te assim, vestida de serenidade e encanto, em Shambala, a cidade mítica e esquecida do deserto, em contraluz gerada por uma miríade de nitescências de cristais, gelo e areia.

Contemplei-te, pois, trajada de dignidade, bondade e meditação, junto à estátua de oiro do velho Gautama, no Jardim dos Poetas. E só dei pela noite quando tu saíste, e as estrelas te seguiram.

Só eu fiquei na escuridão.
Sonho-te agora, na penumbra dos dias, sob o azul fulgurante das memórias que flutuam sobre as searas brancas e luminosas da Cidade-Utopia, e espero-te. Na encruzilhada dos Oito Caminhos. Junto à estátua do velho Siddhartha. Em sonhos te aguardo.

Peregrino, in o "Templo das Palavras Esquecidas"


Arcangelo Corelli, "12 Sonatas para violino, violoncelo e clavicórdio"
Fragmento "nº 12, La Follia" (1700).




Geometria


Hoje não falarei, meu amor,
das essências do Oriente
nem da ambrósia que rocia os teus lábios.
Tão-pouco referirei
os capitosos elixires
do amor e da existência,
ícones sagrados da tua presença.

Hoje quero falar, e só,
da geometria acesa do teu corpo
e da gramática estilizada dos teus lábios,
onde paira a divina parábola.
Quero que saibas
que os teus olhos acendem os meus
e que meus dedos buscam nos teus
o alfabeto rosa
com que costuro as palavras.

Hoje quero falar da geometria
das colinas onde crescem as cerejas,
da planície e do monte do desejo,
do teu sangue quente,
que conduz nas minhas veias
o consolo e o alento.

Hoje quero falar dos ramos da hipérbole
que convergem na tua cintura de deusa grega,
das curvas elípticas dos teus lábios,
da linearidade do teu carácter,
da textura aveludada da tua pele,
do calor do teu corpo,
que me abriga e dá prazer;
do trigo do teu cabelo,
do aroma dos teus lábios
e da cintilação dos teus olhos
à luz azul-rosa dos néons da alameda.

Hoje não falarei, amor meu,
de néctares nem de filtros,
nem de essências do Oriente;
tão-pouco vou falar do azul do céu,
do etéreo timbre dos violinos de Corelli
ou do sonho que me prende, recorrente.
Hoje quero, amor, que ouças apenas, e tão-somente,
a geometria das coordenadas do meu silêncio...



Germán Diaz, "Ausência".




que farei das palavras sem o mel
lunar que escorre do teu rosto?
que farei do lume deste verbo
que nasce das pedras pandas
e trepa e viceja e medra como hera?


sim, que farei das palavras em que navego,
sem a simetria da parábola do teu torso?
que farei eu, que sou a assíntota
da hipérbole infinita do teu corpo?


que farei dos violinos de outono
que acordam e soluçam o meu desespero
quando anoiteço à deriva
como um rei sem trono?


que farei nos degraus oblíquos do amanhecer
por entre o zéfiro e o roxo das uvas
no odor morno e agridoce a fruta e a vinho mosto?
sim, quem me vai acordar “when september ends”?



Arcangelo Corelli, "12 Sonatas para violino, violoncelo e clavicórdio"
Fragmento "nº 12, La Follia" (1700).




Sonhos, vagos sonhos...




Sonhos, sonhos vagos,
sonhos azuis, castanhos,
delírios conscientes
germinados no sal da saudade.


Sonhos, vagos sonhos
que suspendem no vento
a minha voz silenciosa
e os meus segredos.


Sonhos, vagos sonhos, breve esperança
que a brisa singela eleva nos seus dedos
qual arco-íris que vagueia embutido
na bola de sabão duma criança.



Pela Paz, contra a Guerra!





Pela Paz, contra a Guerra

[Escrito a 12FEV2003 (5 semanas antes do início da guerra do Iraque)]


Umbelas, aviões e helicópteros
estrelam o céu azul eterno
do país da lendária Semíramis.


Rambos pintados destilam filtros de ódio
no berço da Primeira Civilização
e matam e morrem em guerras de petróleo
para impor a Babilónia o seu padrão.


Fragrâncias das Mil e Uma Noites
caldeiam-se com cheiros acres a Vietname
nos céus que foram da antiga Babilónia,
agora rastreados a branco por mísseis Sam.


E voltam a cair do azul infindo,
no suor dos camuflados amarelos
e de verde suspeito,
não babilónicos sonhos a Sherazade
mas Medusas que a sábia Ateneia
transforma em serpentes
que rastejam areias de oiro em pátria alheia.


E chovem divisões, tanques,
navios de guerra, jipes, camiões,
exércitos de Yankes,
helicópteros, aviões e
mísseis balísticos ar-terra-mar
em todas as combinações.


E há bombas laser,
porta-aviões,
granadas, balas e outras munições,
máscaras anti-gás,
baterias de canhões
e armas electrónicas.


Alguém viu armas químicas,
nucleares, biológicas?
Não?
Porquê a guerra então?!


Em terras de amavios e de essências
há filtros de ódio e contingências
de guerras económicas de petróleo.


Na madrugada do deserto inda estrelada
perecem xiitas, sunitas, americanos,
baralhando religião e liberdade,
quando se batem e tombam
apenas pelo ouro negro de Bagdad.


E morrem com estes homens,
crianças, velhos, jovens,
e mulheres duplamente sacrificadas
pela Bíblia e pelo Corão.
Tudo isto no país de Aladim,
terra que foi de fadas
e de varinhas de condão;
terra de magia e de lendas,
de princesas, mágicos tapetes e sultões,
em que a mítica Bagdade
apenas tinha um Ladrão.


Acabaram os elixires
no país de Sinbad,
ora sem génios nem grão-vizires.
Os tapetes mágicos
são agora aviões F-Dezoito e F-Dezasseis
e poderosos mísseis cruzeiro
trepassando os céus sangrentos de Bagdad.


Em terras de amavios e de essências
há filtros de ódio e contingências
de guerras económicas de petróleo.


Na antiga Babilónia e na velha Assíria,
terras de lendas, berços de antigas civilizações,
não queremos heróis a haurir o hidromel das Valquírias;
tão-pouco concebemos o retorno dos Quarenta Ladrões.


[Pela Paz, contra a Guerra,
virtuosa frase que a honra encerra!]


12FEV2003






Wolfgang Amadeus Mozart, Requiem, K626, 1791 fragmento “ Lacrimosa”


Rafah, Faixa de Gaza, Abril de 2002



A fúria assassina das balas rastreia
o corpo inocente duma criança da Palestina.
Não é lenço, a gaze branca e breve que lhe contorna a fronte.
Tampouco é burqa ou xador, a túnica alva e longa
que lhe envolve o corpo tenro. É um lençol de sangue.
Tinha seis curtos anos, esta menina;
os pais lhe deram um nome: Somaeah Hassan.

omnia vincit amor



omnia vincit amor



é brisa é eco raiz lamento
e no entanto não chora nem ecoa
antes ruge e troa tão pungente
tão indefinido quão incerto e transparente
que não é chuva nem é fogo nem é vento
é antes e tão-somente uma furtiva lágrima
um sentir de poeta um reflexo de luz intenso
tão demorado tão oculto e tão dolente
e é de tal forma e de tal sorte tão premente
que ressoando clandestino pelo peito
sentindo-se contudo não se sente
e ardendo todavia não se extingue


Nota: o título do meu escrito, "omnia vincit amor", foi retirado do verso 69, da Écloga X, de Virgílio.




Pyotr Ilyich Tchaikovsky - "A Bela Adormecida" (1889) - frag. "Panorama"





Cavalos da luz e do vento



Dizes-lhe que chame a si o pégaso de asas de oiro e o unicórnio de crinas de alabastro, a que chamas os cavalos da luz e do vento, que, na sua pureza e justiça, e flanqueando todos os abismos, a levarão para bem longe das suas angústias, mágoas e pesares, e a conduzirão ao reino transparente do fantástico, onde abundam o amor, o mel, o leite e o vinho ático da sabedoria e da ternura, e onde não há adversidades, nem desafectos, nem desventuras. Dizes-lhe, também, que coloque no Pégaso e no Unicórnio, respectivamente, uma brida de prata e outra de oiro.

Acrescentas que nesse reino cada vento pertence a um só quadrante e cada quadrante a um só vento, por forma a que ela possa determinar o perfume exacto em cada ângulo. Assim, o aroma doce do zéfiro será diferente do brando perfume do galerno, e a fria fragrância do bóreas distinta dos odores acres e abafados do desértico e arenoso suão ou do austero e sibilante vulturno.

Dizes-lhe, ainda, que não se preocupe em saber qual o caminho a seguir, e que deixe tal tarefa aos cavalos da luz e do vento, pois que eles e só eles conhecem os quadrantes de onde emanam os excelsos aromas das flores e das palavras, que são os que conduzem à serenidade, à paz e ao amor.

Não usará sela, nem estribos, nem botas, nem esporas, nem puxará as bridas de prata e de oiro, porquanto elas são, tão-somente, um adereço exigido pelos cavalos da luz e do vento como preito à dignidade e nobreza dos seus equivalentes terrestres.

Cavalgará de dia o fulgurante unicórnio, e logo que Vénus se acenda no poente, montará o possante pégaso, até que o Sol incendeie de púrpura e violeta os arrebóis da madrugada, altura em que desmontará e subirá de novo para o dorso veludíneo do unicórnio. Assim fará durante três dias e três noites, ao fim dos quais entrará no reino encantado da Música e da Poesia, onde Apolo e Calíope, ao som de sonatas e poemas declamados, passeiam de mãos dadas sob o sol dos tempos, por entre as flores dos cômoros e das alfombras aveludadas do Olimpo.

Peregrino, in "O Templo das Palavras Esquecidas"


Vicente Emilio Sojo (Venezuela, 1887-1974)
Cinco Piezas Venezolanas - I,Cántico (1940)



sueño



baja carmíneo el sol en la montaña fría,
mientras en mi piel el rojo vino
sangra en la ilusión de la rubra aurora.
en mis ojos la visión serena, mía,
del rocío de la madrugada que llora
por ti lágrimas de amargada nostalgia.


en mis anhelos tengo la mirada clara
de tu cuerpo desnudo, albos senos al viento,
altos cumbres, que una vana quimera
convierte mi fantasía en vil tormento.


flagro en alcobas de vagos doseles,
de rúbeos veludos volitando al cielo,
en áridas colinas, yermos vergeles
de ausente placer en noche de breo.


en lunas de plata y en soles de oro,
cabalgo sin descanso noche y día
buscando tu olimpo, divinal tesoro,
para levarte hacia la secreta playa,
y, en la pureza de la llama que me consume,
besarte, mi alma, antes que la mía se vaya.



ME BASTA ASÍ



"La palabra en el aire". Pedro Guerra canta, e o poeta Ángel González recita o poema que se segue:


ME BASTA ASÍ


Si yo fuese Dios
y tuviese el secreto,
haría un ser exacto a ti;
lo probaría
(a la manera de los panaderos
cuando prueban el pan, es decir:
con la boca),
y si ese sabor fuese
igual al tuyo, o sea
tu mismo olor, y tu manera
de sonreír,
y de guardar silencio,
y de estrechar mi mano estrictamente,
y de besarnos sin hacernos daño
—de esto sí estoy seguro: pongo
tanta atención cuando te beso—;
entonces,
si yo fuese Dios,
podría repetirte y repetirte,
siempre la misma y siempre diferente,
sin cansarme jamás del juego idéntico,
sin desdeñar tampoco la que fuiste
por la que ibas a ser dentro de nada;
ya no sé si me explico, pero quiero
aclarar que si yo fuese
Dios, haría
lo posible por ser Ángel González
para quererte tal como te quiero,
para aguardar con calma
a que te crees tú misma cada día
a que sorprendas todas las mañanas
la luz recién nacida con tu propia
luz, y corras
la cortina impalpable que separa
el sueño de la vida,
resucitándome con tu palabra,
Lázaro alegre,
yo,
mojado todavía
de sombras y pereza,
sorprendido y absorto
en la contemplación de todo aquello
que, en unión de mí mismo,
recuperas y salvas, mueves, dejas
abandonado cuando —luego— callas…
(Escucho tu silencio.
Oigo
constelaciones: existes.
Creo en ti.
Eres.
Me basta).


Ángel González
(o poeta faleceu em Madrid, no dia 12 de Janeiro de 2008, com 82 anos de idade)


Camille Saint-Saens, "Sansão e Dalila", fragm."Bacanal"


Miragem


Escrevia-te até à madrugada das estrelas, quando estas se abeiravam da linha ténue e indefinida que separa a obscuridade nocturna do azul radioso da alvorada.
Essa era a hora em que a tristeza, contornando todos os obstáculos e silêncios, se ausentava. No intervalo ameno do teu sorriso, a noite escorria serena e sem ponteiros, confundindo-se com a respiração tranquila da terra. Só a estrela de alva no mostrador de espelhos da etérea abóbada marcava as horas. E assim, Jano e Cronos, no rigor inflexível que distingue os deuses dos homens, determinavam a abertura das portas a um novo dia.
(…)
Era esse o momento solene e sublime em que os meus olhos, sob o efeito fulgurante do lampadário do Sol, divisavam ao longe somente os contornos do teu torso feminino navegando a bordo do vento morno que soprava do Oriente, como se foras uma peregrina miragem. Mas à medida que te aproximavas, as ondas resplandecentes dos teus cabelos, associadas às linhas bem definidas da tua túnica, moldavam sobre o fundo de areia o teu corpo de deusa-menina, mostrando-me que o fulgor dos teus olhos não era uma alucinação dos meus sentidos. Eras mesmo tu, fina no porte e ágil na cintura, fresca e harmoniosa como sempre, que, trazida pela brisa levantina do meio-dia, flutuavas por entre as sombras vaporosas das palmeiras e dos sicómoros, por dentro do silêncio quente e perfumado das dunas do tempo que tornam imutável a razão das coisas.


Nesses ditosos momentos, imóvel e envolto no teu delicioso perfume, esquecia tudo e todos na distância dolorosa oculta pelo sal das lágrimas, e também de mim me esquecia, como se houvera regressado aos juncos, às pedras polidas e profundas, e aos verdes limos das ribeiras cristalinas da minha infância.



Peregrino, in "O Templo das Palavras Esquecidas"